
Aos poucos elas foram chegando. Arrumadas, perfumadas e com um alto-astral contagiante. Naquela quarta-feira de manhã, oito mulheres com mais de 60 anos foram convidadas para uma entrevista. À sombra de uma árvore, numa roda de bate-papo, elas contaram histórias de causar inveja em muita gente mais nova. Essas senhoras participam do Programa Universidade Aberta à Terceira Idade (Unati) da Universidade Estadual de Goiás (UEG). Os interessados precisam ter mais de 60 anos, escolher uma ou mais atividades que queiram participar, se inscrever e ter pique para acompanhar os colegas.
Tracy, Eleuza, Maria Gomes, Nicócia, Maria Madalena, Alice, Maria do Nascimento e Erondina (da esq. para dir.)
É o caso da Maria do Nascimento, a caçula da turma, sorridente e com olhar jovem. Tem 64 anos e há três frequenta o Unati. O Programa oferece gratuitamente ioga, equilíbrio, dança, pilates, hidroginástica, musculação, treinamento funcional, oficina de movimento, caminhada e palestras. Dessas, Maria pratica ioga e pilates. Só no ano passado foram atendidos mais de 200 idosos, entre homens e mulheres, sendo 95,8% público feminino. As inscrições devem ser abertas no próximo fevereiro e para este ano, a previsão é que sejam inseridas as atividades coletivas tênis e handball.
Ioga, uma das atividades mais procuradas
Foto: Renata Carvalho
O Unati é um projeto de extensão da UEG destinado aos idosos com o objetivo de dar autonomia e independência a esse público através do desenvolvimento de ações voltadas à construção do envelhecimento ativo. As atividades são realizadas por professores e alunos da Instituição. A coordenadora do Unati, Renata Carvalho, ressalta que além dos benefícios para o organismo, as relações afetivas que são estabelecidas nas aulas são extremamente importantes. “Tem esse lado social de poder conviver e compartilhar com o outro”.
Para as animadas Tracy Martins Santana, 71, Maria Gomes, 66, e Eleuza do Nascimento, 65, as atividades e o convívio servem como terapia. “É uma bênção. Fico capenga se não tiver isso aqui”, diz Tracy. A colega Alice de Souza Almeida, de 72 anos, frequentadora de ioga, hidroginástica e treinamento funcional, ressalta o ambiente agradável da Universidade. “É jovem falando alto para todos os lados. É bom estar no meio deles”. As aulas acontecem na unidade da Eseffego da UEG, na Vila Nova, em Goiânia, onde são oferecidos os cursos de Educação Física e Fisioterapia.
Coordenadora do Unati, Renata Carvalho
Os projetos de extensão têm o objetivo de viabilizar a relação transformadora entre a universidade e a sociedade. Para a professora Renata, a Universidade tem uma função social. “Abrir esses espaços, trazendo a comunidade para dentro da universidade é um elemento importante tanto para a comunidade como para gente que está dentro da universidade trabalhando; eles adentram à universidade e têm acesso ao conhecimento que produzimos aqui. É um momento de diálogo importante para os dois lados”, diz Renata.
Energia de sobra
Modernas, elas gostam da tecnologia
Nada de cabelos grisalhos e pele descuidada. Longe dos antigos estereótipos criados para os idosos, Nicócia Rodrigues tem 75 anos e esbanja beleza. Também participante do Unati, além de cuidar da saúde, ela gosta de cuidar da aparência, já foi Miss Terceira Idade e dá a dica. “A gente tem que se amar primeiro”. A amiga do Unati Maria Madalena de Souza também tem animação de sobra. Da mesma idade, ela diz que gosta de viajar para Caldas Novas com frequência e ao exterior uma vez por ano. Quando questionada se sobra um tempinho para o crochê, ela logo grita: “Nemmmm! Não gosto de crochê não. O WhatsApp veio para substituir o crochê”.
As entrevistadas são unânimes ao falar que não se sentem bem quando são vistas como idosas frágeis. Alice enfatiza que não gosta quando falam no diminutivo com ela. “Não gosto quando professor fala para levantar o bracinho, a perninha. É braço, é perna”. E complementa aos risos. “Eu só lembro que sou idosa quando alguém oferece o banco para mim no ônibus”.
A ida ao médico para essas senhoras também não é nenhum problema. São sempre elogiadas e há pedidos do segredo de tanta jovialidade. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2008), as doenças crônicas mais prevalentes neste público são hipertensão, artrites, doenças do coração, diabetes e depressão. 69% da população idosa tem pelo menos uma dessas doenças. A médica geriatra Ana Maria Porto Carvas, do Hospital Geral de Goiânia (HGG), recomenda a prática de exercícios físicos e uma alimentação saudável para quem deseja ter um envelhecimento saudável.
“É importante fazer exercícios que sejam prazerosos, sempre com acompanhamento de um profissional. Ainda deve-se alimentar bem com pratos coloridos que tenham pouca fritura, pouco sal e também evitar alimentos industrializados”. Outras recomendações são beber muita água, usar protetor solar e ir ao médico com regularidade.
O outro lado
Se de um lado tem a energia positiva das senhoras do Unati; do outro, idosos precisam dessa energia, que pode ser transmitida por meio de mensagens de carinho ou simplesmente por ouvidos e olhos atentos. E é isso que faz o projeto Vovô Sabe Tudo. Mentora deste projeto de extensão, a professora de Pedagogia da UEG de Quirinópolis Sirlene Maria Soares, junto com estudantes da universidade, vão a um asilo da cidade uma vez por semana. Uma tarde inteira para escutar as experiências e histórias dos 30 idosos com idade entre 60 e 100 anos.
Uma tarde de atividade no asilo
Foto: Equipe do projeto
Segundo Sirlene, o foco do projeto é escutá-los, mas com frequência são realizadas também atividades como dominó, xadrez, eles fazem as unhas, cantam. “Muitos idosos, quando percebem que estamos chegando, já pedem às cuidadoras para os colocarem nas cadeiras e irem para fora. Muitos choram”. O projeto surgiu em 2008 da vontade da professora de ajudar a quem precisa e, que depois, incentivou os alunos. Hoje ela vê que os resultados são positivos. “Reduziu muito o uso de medicamentos. Quando vamos, eles ficam mais tranquilos. A maioria ali não recebe visita de ninguém. Na época de férias muitos ficam doentes sentindo nossa falta”.
A doação de tempo e carinho faz bem também a quem faz o bem. É o caso da aluna de Pedagogia Eliana Cristina, que participa do projeto há três anos. “Percebi que só de conversar com eles [idosos], eleva a autoestima. Eles se sentem valorizados”. Para ela, a ação a fez melhorar de uma depressão. “Eu me transformei. Já passei por muita coisa nessa vida. Já morei em outro país que já teve até terremoto, trabalhei muito para cuidar das minhas filhas, e até hoje tenho a vida corrida, mas arranjo tempo para ajudar”, afirma Eliana orgulhosa.
Saberes compartilhados
Alice, do Unati, dá a dica aos jovens que desejam ter uma vida cheia de energia como a dela. “Comecem a exercitar desde cedo, se cuidem e tenham contato com a natureza”. Buscar uma melhor qualidade de vida precisa ser a meta do idoso e proporcionar essa qualidade de vida à terceira idade é missão das outras gerações.
Podem ser passos rápidos para a caminhada matinal ou lentos para voltar ao quarto; podem ser falantes ou já ter a audição afetada pelos anos passados; podem ter as mãos trêmulas depois de muitos anos de trabalho ou ainda firmes para cuidar da casa. Todos os idosos merecem respeito porque, como bem lembra Alice, “um dia você também será um idoso”.
-Goiás Agora