
É VERDADE QUE EU POSSO REDUZIR O ICMS DA CONTA DE ENERGIA?
O Jornal Folha de Ceres buscou informações com o Dr. André Luis Moreira Silva, advogado tributarista, sócio da ALMS & Advogados Associados, que nos passou um relato sobre o tema.
(...)-"Na última semana muitos amigos me abordaram com a seguinte pergunta: André, você viu aquele negócio do ICMS na conta de energia? É verdade?
E eu respondia: Depende. De qual ICMS vocês estão falando? Nos tribunais existem algumas discussões acerca de ICMS e energia, mas é complicado responder sem saber direito do que vocês estão falando".
E sempre ouvi como resposta: (...)-"ué, não sei direito, mas parece que é o direito de pedir uma restituição de ICMS cobrado indevidamente e o prazo para pedir a restituição acaba essa semana".
Logo fiquei sabendo que se tratavam de alguns vídeos que circulavam pelas redes sociais, naquilo que me pareceu ser uma estratégia agressiva de captação de clientes, com impulsionamento em rede social. Mas, enfim, resolvi dar uma olhada neles e decidi escrever sobre o assunto do qual eles falavam. Até porque fiquei devendo uma resposta para aqueles amigos que me provocaram a pesquisa.
Depois de ver os vídeos, percebi que aqueles amigos estavam falando do caso do ICMS inserido em duas das tarifas que compõem o valor da conta de energia elétrica, que são vulgarmente conhecidas pelas siglas TUST e TUSD, que significam Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão e Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição. A tese não é nada nova. Aliás, eu mesmo já tinha falado sobre o caso com um deles há um tempo atrás.
De maneira bastante singela a TUST e a TUSD são, como o próprio nome sugere, tarifas pagas pelo consumidor, pelo uso da rede de distribuição e pelo uso do sistema de distribuição de energia. Dito de outra maneira: é o valor pago pelo canal que leva a energia até a sua casa.
Pois então, sobre essas duas tarifas há incidência de ICMS, que é o imposto incidente sobre a CIRCULAÇÃO de mercadorias e serviços, e é exatamente aí que está o problema: no conceito de circulação, que compõe o núcleo da materialidade da hipótese de incidência do imposto. Em outras palavras é a operação sobre a qual incide o tributo e que tem reflexo na base sobre a qual a alíquota vai incidir, para gerar um resultado financeiro, que será o tributo a pagar.
Toda a questão começou quando o Superior Tribunal de Justiça proferiu uma decisão reconhecendo que a TUST e a TUSD não representam energia efetivamente consumida, porque para aquele tribunal a circulação a que se refere a norma do ICMS é uma circulação jurídica e não apenas física, ou seja, a mercadoria sobre a qual o imposto deverá incidir é somente aquela que se transformou em energia dissipada e convertida em calor ou luz, por exemplo. Assim, o custo referente a transmissão dessa energia que chega até as tomadas de nossas casas (TUST e TUSD) não pode compor a base de cálculo do ICMS, pois o canal não pode ser confundido com a própria mercadoria.
Não é o que acontece. A TUST e a TUSD estão sim inseridas na base de cálculo do imposto e não é difícil investigar isto. Basta examinar sua fatura de energia.
Como eu disse, essa discussão no STJ não é nova. Tal questão, aliás, está afetada ao regime dos recursos repetitivos lá naquele tribunal desde o ano de 2017 (tema 986), o que significa que alguns casos foram escolhidos para serem julgados e o resultado destes casos deverá ser reproduzido em todas as ações de natureza idêntica. E por esta razão aquela corte superior determinou que sejam suspensas todas as ações que tratem deste tema, e este é um fato importante.
É bem verdade que depois da decisão no STJ aconteceu uma chuva de ações na justiça, onde era comum os juízes concederem liminares permitindo a exclusão da TUST e da TUSD da base de cálculo do ICMS, e com esta decisão a conta de energia, de fato, passava a ficar mais barata. Para se defender, o Estado alega principalmente que o canal de transmissão é indispensável à entrega da mercadoria (energia), e que a exclusão da TUST e da TUSD da base de cálculo do ICMS na energia acarretaria uma brusca queda na arrecadação.
Atualmente os tribunais já não estão concedendo decisões liminares como vinham fazendo anteriormente. Não existe consenso, as decisões são divididas entre os juízes e também entre os desembargadores e é preciso habilidade para ser sutil e alcançar a pretensão logo no início do processo. Percebe-se, entretanto, que a questão não está, de fato, resolvida, porque ainda pende discussão lá em Brasília. E se tratando de Brasília absolutamente tudo é possível (quem é advogado entende bem o que eu digo).
Ademais, ao se beneficiar de uma liminar é necessário ter a consciência dos reflexos que isto pode causar lá na frente, caso a ação venha a ser perdida, pois volto a repetir: em Brasília tudo pode acontecer.
Por isso vale um alerta: tenha cuidado ao se deparar com uma dessas propagandas do tipo “tenha seu dinheiro de volta” ou “clique aqui e aprenda como recuperar dinheiro de conta de energia”. Os dois vídeos mais sugeridos pelo Youtube, que tratam desse assunto, ambos com centenas de milhares de visualizações, trazem informações não muito técnicas e pouco claras, mas que usam o gatilho mental da urgência (técnica de vendas muito comum) para forçar o cliente a fechar logo um contrato, mesmo sem saber bem o que é. Os anúncios, via de regra induzem ao fechamento imediato com frases apelativas do tipo: “clique aqui e descubra, POIS O PRAZO ACABA AMANHÔ. Esta afirmação não é verdadeira porque não, o seu prazo não está acabando.
O fator tempo é sim relevante, porque além de buscar uma liminar para a redução imediata das faturas de energia, é possível recuperar o que foi pago indevidamente nos últimos cinco anos, e este limite é demarcado por conta do prazo prescricional do tributo, o que significa que quanto mais você demora a procurar a justiça, mais seu direito se consome no tempo, mas mesmo assim você ainda pode procurar a justiça para resguardar seu direito que não está prescrito.
Portanto, é sim verdade que é possível reduzir a conta de energia através de uma ação judicial, e na maioria das vezes isso é muito vantajoso, mas antes de propor uma ação, vale a pena examinar cuidadosamente o que pode acontecer lá na frente, porque nem todo caso é igual e em Brasília tudo pode acontecer.
Fonte : André Luis Moreira Silva, advogado tributarista, sócio da ALMS & Advogados Associados.